terça-feira, 3 de agosto de 2010

Ilusão

Por: Bia Sallesse

Um grande medo que eu tinha antes de imigrar para o Canadá era o de não saber como manter as relações com as pessoas que amo e de quem estaria longe.

Antes de partir, tive a oportunidade de ouvir um pai falar sobre isso. Não se tratava de nenhum “guru” ou mestre da auto-ajuda, mas um simples pai, como o meu e o seu, que pode explicar que sua relação com seu filho que mora na Alemanha é praticamente a mesma de quando ambos estavam no Brasil. Ele não deixou de participar dos momentos e decisões importantes porque estava longe, a diferença é que, em vez de falar o que pensava e o que sentia pessoalmente, agora era via msn. Achei estranho na época, mas levei essa ideia comigo.

Confesso que, logo que cheguei, mil dúvidas passaram na minha cabeça, mas a decisão estava tomada e tinha que seguir em frente. Em meio a tantos pensamentos, lembrei-me do relato desse pai e, durante dois anos, observei como estava minha relação com meus pais e comparei-a com esses 30 anos de experiência que eu já tinha vivido.  Com o tempo, comecei a fazer o mesmo com meu marido e seus pais e uma amiga, que já conhecia antes de imigrar, e os seus.

Faço, aqui, minhas palavras as palavras daquele pai. As relações não mudam! Elas podem até sofrer alguma adaptação, pois não daria mais pra almoçar todo domingo na casa da mãe. Existe, sim, um filtro, baseado no que o narrador considera mais ou menos importante, o que é muito bom, pois não é preciso saber que a irmã da tia-avó operou as varizes, mas a essência continua e darei um exemplo logo em seguida.

Voltamos pro Brasil exclusivamente por causa de nossa família, que sofreu muito e visivelmente nesses dois anos de Canadá. Acho que por causa desse sofrimento todo, em algum momento minha experiência social foi esquecida e acreditei que as coisas seriam diferentes; que minha presença no Brasil seria indispensável (nunca é!). Mas, chegando aqui, só pude constatar o que já sabia – as relações não mudam!

Antes, acreditávamos que nos escondiam os fatos porque estávamos longe e não poderíamos ajudar muito. Aqui, constatei que nos escondem os fatos porque somos esses filhos amados (e talvez ingratos, como brincaria minha mãe) e, no fundo, no fundo, não faz a menor diferença, pelo menos aparentemente não, estarmos cá ou lá.

Esse é o sistema em que minha família está calcada. Se fosse uma família que compartilhasse mais, talvez eu tivesse exercitado o ajudar, e talvez o conviver, à distância. E olha que seria um belo exercício! Afinal, à distância, somos “obrigados” a desenvolver a criatividade, muitas vezes dormente, pra sermos capazes de demonstrar o quanto amamos aqueles que nos são tão caros. Buscamos gestos e palavras, às vezes não muito utilizadas, que provavelmente não buscaríamos se convivêssemos pessoalmente.

Por outro lado, a família da minha amiga é do tipo “super compartilhadora”. Eles se encontram na net, três vezes por semana, e conversam por horas, contando todos os detalhes da vida, independentemente de estarem no mesmo ambiente ou não. Eles não tem o toque, mas mantêm o conviver e o compartilhar.

No fim, quando estávamos lá temia perder essas relações que tanto prezava. Agora que voltei, questiono-me se a distância seria mesmo capaz de matar aquilo que construímos fortemente ao longo de uma vida. Começo a achar que era pura ilusão.

Um comentário:

  1. Oi Bia,
    Decidi escrever para dizer que...concordo com todas suas palavras e ainda tenho minha experiência para acrescentar!
    Nasci e cresci em São Paulo, quando tinha 27 anos fui morar em Florianópolis, depois vim pra Salvador! No início foi muito sofrido! Sofríamos todos pela distância! Mas, eu pai, aprendeu a usar o skype, msn e criei um email pra ele e... deixei minha webcam por lá para vê-los e matar a saudade!
    O saldo foi totalmente positivo!
    Posso dizer que apesar da distância, por todo esse tempo longe, nunca tivemos tão proximos e participativos um da vida do outro! Somos mais amigos, confidentes e quando vamos visitar meu pai, que agora é vovô, os momentos são de intensa alegria e desfrutados 100%! Diferente de quando morava com eles, onde haviam dias que a gente mal conversava em função da disponibilidade imediata e falta de assunto!
    A distância, não separa! Ela tranforma as relações!
    Nossa distância agora vai aumentar mais... pois estamos indo morar na Venezuela e também pretendemos imigrar no futuro para o Québec!
    Bjs pra vcs,

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